domingo, 6 de dezembro de 2015

Inversão aos ventos da invenção


De ti construí a imagem mais bonita
Tela pintada a dedos
Bordado de ponto-cruz
Corte de veludo mais fino
Macramê

Mas foi-se o tempo,
veio a ventania
de longe,
tudo trazendo e levando

Trouxe água pra lavar minhas mãos
Ferida pra curar os dedos
Algodão cru pra apurar a realidade
Desfez-se os nós que se tinha de saudade

Desfigurando do teu arquétipo inventado,
esvaziou-se em mim em poesia
sem imagem
nem porta-retrato

E paraverseando o grande poeta itabirano

“Amiga,
afinal nos compreedemos.
Já não sofro, já não brilhas,
mas somos a mesma coisa.

(Uma coisa tão diversa
da que pensava que fôssemos.)”

quinta-feira, 3 de dezembro de 2015

Colcha de retalhos

Quanto de ti restou em mim dos tempos vividos do que foi ontem?
Do teu riso de canto de boca
Dos teus riscos coloridos na pele
Do teu arredio jeito de chegar
Da tua delicadeza latente
De teu marasmo de maré
Tua sedução de olhos transparentes
a curva do nariz, talvez
as curvas do corpo
O jeito de levantar as sobrancelhas quando digo algo curioso
O cheiro que sai dos poros das têmporas
ou de trás das orelhas
O toque suave
A pegada precisa
As mãos indecisas
O compartilhar de instantes com profundidade e leveza
As vezes pontuais
Outros prolongados
Em segredos, traços, gestos
Desapegando do que bem não faz
Entendendo da vida os processos naturais
Sabendo que nada me pertence
Que o eterno é o instante
E que tudo tem um sentido em nossas vidas
Aproveitando o melhor de ti
Espero que de mim tenha ficado a melhor parte
E que em nós o amor se face, desface e reface 
em diversas formas
Em arte de rua
Em poesia de porta de banheiro
em terra fértil em região chuvosa
Que cresça arvore espessa e traga sombra e descanso para o peso dos nossos dias

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Palatável



O desbravar da língua pra fora,
o que em mim implode,
sai, sem demora.
Em verso
Em prosa
Em conversas adversas
de dedos e olhares
que às vezes não se cruzam,
nem se tocam,
mas são transmitidos,
transmutados,
sentidos.
Ouvidos em um mar que me abraça
Do cheiro sublime resgatado da memória
Vasta
De onde vem?
Pra onde vai?
Se soubesse não faria sentido
É trânsito            
É diálogo

Sinestesia.

terça-feira, 24 de novembro de 2015

Reencontro

Do simples cotidiano desvelado
Dispensando fórmulas, amarras, previsões e proscrição.
Que quero mais do que apresentado?
Alimentar as ilusões ego?
Te fazer moldura em meu quarto?
Me despossuir do que é sentido?
Não, nada disso.
O amor se faz ao vento
É paz
É querer bem
É estado de presença
É alento
É entendimento que dispensa palavra
Que vem dos olhos, que vem de dentro

De outras vidas, quem sabe...

Caminhos


Pode ir e vir 
Exercer sua liberdade
Caminhar pela cidade 
Conhecer as ruas, os becos, os ladrilhos 
Pois meu amor é porteira escancarada
 É jardim florido
 É caminho de rio que em mar deságua 
 É roça sem cerca 
 É caatinga braba
 É o brilho do sol de dia
 É noite de lua cheia
 É o cantar do galo de madrugada

ECOS


O tempo saiu armado                                         
com couraça pesada,
atrasado.
Noite de tempestade                        
Era puro concreto
Luzes incandescentes
Buzinas intermináveis
Os olhos que tanto viam,
então cegaram.
Os pés ligeiros se enraizaram
Os sentidos outros inebriados,
com a chuva foram levados.
Lavando as ruas dos corridos passos,
da métrica dos compassos
dos ponteiros poluídos pela ilusão do tempo.
Então parado, cego e despossuído, pôde-se olhar pra dentro
e viu-se:
De olhos amplos soube olhar pra trás e nada trazer
e soube olhar pra frente sem nada querer.
Os olhos descansados de tantas visões não vistas,
abriu-se em meio ao caos de tantas construções
E a brisa era leve
O céu estava aberto
O sol brilhava na luz do fim de tarde
E pôde-se ver um pássaro pousado em uma árvore frondosa
entoando canto cuja ressonância ecoava em

“Tempo, tempo, tempo...”

(21 de outubro de 2015)