segunda-feira, 13 de fevereiro de 2017

Poesia sem tamanho

Pernas de alicate,
olhos de jabuticaba madura, curiosos.
Sorriso que brilha mais
que o sol do meio dia

Pele ambrosiada,
de sardas pintada,
de todo o resto que me afeta,
mas não precisa de fala

E ela fala...
Fala que às vezes me grita aos ouvidos
E se cala, se fecha a sete chaves,
as vezes só, outras, acompanhada.

E ela muda de nome
Cansou de ser Maria,
cansou de ir com as “outras”
Quer ser gente

Diz-se Ana
Mulher forte,
destemida que enfrenta
maremotos e tempestades

Ana quer o mundo
Quer a todos
Quer a si própria
E não quer ninguém

Mas o mundo é pasto
É boi
É boiada
É vida de gado

Ana se entristece
porque é madeira de lei
Quer animais silvestres,
mata fechada

Então, Ana se devasta
E Maria fala
Fala cada vez que Ana cede,
que se sente só, que se aborrece

Acha que tudo é fase
Que tudo é métrica
Cálculo matemático
Previsão virginiana

Que deus é sarcástico
Que viver é um tédio
Metafísica é o caralho
E foge pra dentro de si

E dentro de si vê Ana adormecida
Embriagada de tantos quereres
Taxada de louca, desvairada,
Esquecida

E diz: “acorda, Ana!
Ainda é cedo, dá pra sair, troca de roupa,
assim, assim...,
Um pouco mais ousada”.

E se vê bem
Se auto assimila
Alimenta e mata
alguns desavisados na esquina

E Ana vai à busca
De todos os líquidos emissíveis quer beber
De todas fontes secar
Quer achar oásis no deserto

De certo que me desperta
tão indissolúveis sensações
de dizer:
“Vem Ana, em rio calmo desaguar”

Mas ela quer mar,
oceano aberto
Pobre de mim
que não sei nadar

Que me liquidifico
Em poças d’agua
Que boio no raso
Com medo de afundar

Que me derramo no desmantelo
Que bebo água no desespero
Que evaporo
Pra não me afogar

E fico na maresia
vendo a beira mar,
a terra firme
que se faz Maria

E a navegar
por águas insanas
Ouvindo o canto de Iara
Nas barbatanas de Ana

Mas o vento vai e vem
Água, terra,
em barro ao fogo se solidifica,
e a própria natureza dá forma

Não são meus dedos que vão te moldar
Não são essas palavras
que vão te emoldurar,
mas esses versos vão...

Dissolver minhas sensações
Dispersar meus sentimentos
Dizer silêncios
E distinguir sede de saciedade.