segunda-feira, 17 de dezembro de 2018

O pouso das palavras


As palavras às vezes fogem,
se escondem pra não serem denunciadas,
ficam mascaradas em gestos, olhares, vontades

De dizer o que se sente sem medo do desamparo,
sem vergonha do se despir em público do pudico
despreparo do vir a ser.

Tanto a escrita como a fala
tanto explica como cala
as vozes do querer

Dizem que as palavras lançadas ao vento não voltam
Ai, que bom!
Já foi um bocado embora

Já não são mais minhas
Tem vida própria
Transitam entre as tuas
Transam, geram, criam
outras formas de comunicação
que dispensa o papel e a fala.



terça-feira, 6 de novembro de 2018

A tal da química


Na correria embaraçada entre passos
a drenar linhas de passagens
pra me salvaguardar
Eis que aparece um ser do meu lado
e em um abraço embalado me disse:
“Oxe, tua sina é amar”

E eu que não pude me desfazer do laço
amortecida em dor fina de
um desprendimento do questionar:
“será? Tô ainda...”

Antes que pudesse ver já era dia
E dou pra minar qualquer desculpa de despreparo
E meu ato nina o sono que desfaz
o corte e o sol brilha, metabolizando
tudo que sou em essência:
Pura felicidade


sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Sexta Feira


Hoje acordei e nem era dia. Atordoada, peguei um balde d'água, caminhei o quintal procurando o gato que zunia, que meu sono perturbava, mas nada achei, nem barulho, nem gato, só ventania. Voltei a deitar, mas o sono confuso, um misto de desespero e agonia do momento que estamos vivendo atualmente.
Mas o dia chega e a rotina sucumbe ao calor do sol quente que erraria como sol de meio dia as seis horas da manhã.  E é dia de feira, de cheiros, sons, tons e maciça correria, de ofertas, de pedidos de esmolas, de meninos e seus carrinhos de mão que tiram seus trocados na condução das feiras.  Do povo da roça que vem comprar e vender seus produtos. Desde criança o melhor dia da semana. 
Dia que vovó vinha pra cidade, mesmo com aquela relação distante, sem muito chamego, era apenas um “bença vovó” retribuído “deus lhe ajude minha fia”, sentávamos e ouvíamos aos clamores da veia arretada que durante muito tempo morou na companhia de gatos, galos e galinhas na roça da Laranjeira.
Sexta feira, dia de mais movimento na barraca de banana de tio Jair, na discolância de tio Gildásio, de tia Nilda vender roupas e tia Evani seus beijus de goma.
Dia que a gente ia ajudar painho na feira, seja na época do coco, amendoim ou picolé, aprendendo a dar valor ao trabalho e ao dinheiro desde cedo.
Era também, dia da gente comer uma coisinha diferente na feira, seja um acarajé, um pastel ou bolinho, coisas que tavam bem distantes do nosso cardápio semanal.
Dia que a escola quase não funcionava, quando a gente estudava a noite então...
 A noite de sexta também era quente, embalada pelos anseios de adolescentes, a praça da Babilônia e da Matriz se achavam atoladas de gente, que assim como na feira, buscavam entre o diverso algo do seu interesse.
Hoje a noite não movimenta tanta gente como antes, talvez receio das pessoas de saírem de casa ou outras propostas tecnológicas do momento. Mas a feira ainda é algo pulsante e é o cartão postal que carrego comigo de minha cidade natal. É também o que busco em outras cidades, logo quando chego pergunto: “onde fica a feira?” e por sorte minha morada é numa cidade chamada Feira de Santana, que carrega consigo todos os símbolos de resistência de feirantes que historicamente lutaram e lutam pela sobrevivência e autonomia através das feiras. Hoje é sexta, é dia de paz, de fartura, de correria, é dia de Feira.
26/09/2018


segunda-feira, 1 de outubro de 2018

"Segura a Coisa"


Tolhos faiscados de Olinda,
entre o bloco e o avesso
da boca que passei batom
e intimei teu beiço.
Mas o caminho não era esse.

E foram-se outros,
tortos que nem foice
a ceifar a minha falta de necessidade
de buscar água em fonte seca

Mas tudo que vai volta

E minha volta...
Mais cedo do que eu podia imaginar
foi pra dizer que o mar tava pra peixe,
não pra pescador.

Tua poesia de olhar me captou
e me devolveu muito de mim naquela noite,
como um presente, pois o sol estava a se chegar
aos mesmos dias em que anos antes havíamos sido apresentadas a esse mundo

Sendo filhas da terra seca e da água salgada
Uma milha de distância,
mas uma proximidade de querer bem
que me balança, que me balança, que me balança.

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

Noves fora zero


Imagine só...
Que nasci do umbigo de mainha
numa placenta só
chorei, desmamei, engatinhei
e dei meus primeiros passos sozinha.

Crescida (nem tanto)
mas passada a infância arrodeada de gente
a juventude empesteada de pessoa
Sabendo eu que sou uma
Vem gente me falar da unidade de dois

Me desplaneia tais cálculo matemático
porque penso...
1+1 é 2 e  ÷ por 2 dá 1
só daria 1 se fosse 2-1
e penso que menos nunca é interessante
Ou 2 de 1 reduzido pela metade pra dar um inteiro

Penso que inteiro seja as duas partes
que a soma multiplique
ao invés da divisão subtrair

Não sou boa em matemática
mas as operações básicas
a gente aprende pra não passar troco errado
e não achar que encontrou aquilo que nunca perdeu:
você mesmo.

sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Lavai, lá vai!


Oh, sol, aparece pra quarar minha dor
porque estou de molho
e não tem alvo adiante
que clareie esses nó-de-a de amor.

São marcas que as águas não levam
Não lavam nem a pedra e pó
Ensabo(r)adas  de dessabor

Ve(m)-ne(m)-xi
Q’ (doa), boa (seja)
Veja, desmancha em mim
esse deter(de)gente
e naturalmente, a luz e calor do dia,
desfaz as manchas do que ficou.

Pra que eu enxaguada
me seque a ventania
e me (re) vista
 de algo que se despe.

quarta-feira, 25 de julho de 2018

Cajuína


A gente é criada, programada
pra acreditar nas verdades
nos padrões de normatividade
de amor e de sexualidade que o patriarcado vem reproduzindo.

Um imaginário de felicidade digno de último episódio de novela das oito,
onde não há contradição,
só a ilusão
de uma família ideal burguesa

Onde os bonzinhos se dão bem
e os malvados são punidos,
as mocinhas sempre encontram seu amores perdidos,
depois de varias desavenças
ainda com aquela crença
de um amor pretendido.

Desligar só a TV parece que não resolve o problema
porque essas estruturas ainda se reproduzem em todo sistema,
nos conduzindo a um não entendimento
do próprio querer.

E eu... só queria aquela tarde de domingo
com conversas infinitas e esfumaças,
inebriadas de tanto estado de presença.
Que nada pretendia,
a não ser olhos e dentes
e línguas ardentes de palavras.

E eu, nada entendia
como era possível
uma mulher, como eu,
me preencher tanto com suas palavras
doces e amargas
todas saborosas.

Não tinha explicação de um diálogo tão espontâneo,
de tanta fluidez e conjuntividade
Foi quando desconfiei...
“Será possível
amor assim,
tão simples e desprendido?”

Eu não tava só,
ela também tava acompanhada
E na noite que com ele eu dormia,
com ela eu sonhava.
Sem entender muita coisa, eu pra mim dizia:
"Meu deus, como a vida é vasta e eu não sabia"

A língua não passou das palavras,
mas as palavras reverberaram em textos afiados
Salivados
Desafiando rimas, métricas
Ferindo as normas da língua culta.

E eu... só queria que aquela tarde de domingo não acabasse
Mas foi-se a tarde
A viagem
E tudo de volta a sua normalidade.

Só que não...
Flores foram plantadas em mim
Desde lá, de nada desconfio,
de mim mais entendo, aceito, vivo,
agradeço.

Mas confesso,
que ficou a sede
para além das
P A L A V R A S

Revertério


Quem alimentou os pássaros
reduziu os passos,
pôs-se a ponto de partida
e me deixou à toa

Pensando que tinha em mim
um mar de anestesia
e eu, na verdade, achava
que daria frutos a poesias sem medida

Mas agora me vejo na dificuldade
de dizer qualquer coisa
Queria espremer em sucos de versos
todas as sensações não ditas

Toda negligência própria
Toda falta de ouvidos aos meus sentimentos mais internos
Toda crença sádica num corpo abstrato de sentimentos incompreensíveis
Toda aceitação passiva sem me perguntar: “o que que eu tô fazendo aqui?”

Nada que tire a fome e desperte do sono vale a pena
Nada que produza desconforto e tire seu estado de presença vale a pena

A sorte que eu pensei ter-te tão tua
confundiu-se com temerosidade

Nas minhas águas de noite escura
tua maré alta devastou-se na praia
sem deixar pegadas de quem se banhava
nem castelo de uma criança qualquer

Tua maré alta me fez caminhar pela areia horas a fio
buscando mares pra me banhar
Sem saber que o que eu tinha era sede
de águas doces e tranquilas

água de beber, camarada!

terça-feira, 12 de junho de 2018

Movimento


Despropósito, despautério, vejam só...

É achar que dá pra prender gente
por contrato premeditado,
datado, catalogado, assinado
por padre juiz e coisa e tal

Mal que fosse,
o mundo dá muitas voltas
e ficar presa a imagem do que já foi um dia
não me apetece

Fica quem quer
vai quem precisa ir embora,
esse é o movimento

Sem culpa católica
nem sentimento de tempo perdido,
somos o aqui e agora

E o apego é um carcereiro cego
que esqueceu-se das chaves
sabe-se lá onde

E o tempo é rei
pra saber que nossas dores
não são a ordem do dia.

quarta-feira, 2 de maio de 2018

Desaprivinição


Apois, me diga
se pode haver
estado mais patológico
do que o apaixonado ser?

Dá primeiro problema de visão,
escurece toda a vista
que só vê um clarão
nos zói do outro lado.

Segue dos ouvido
que atina aos sons dos pássaros
e das canções mais besta do rádio

Uma perda parcial da voz
Quando não acompanhada
de pausas e gagueiras

Falta de apetite
por apatia
ou excesso de fome
por ansiedade

Tal qual,
batimentos cardíacos acelerados
dependendo da proximidade
do ser admirado

Um frio na barriga
 (Ave Maria)
às vezes acompanhado de calor

Calor...
Nas partes íntimas,
como pode se dizer,
constante quentura e umidade

Pernas se apressam
a passos de corrida,
a noção de tempo e espaço
parece tá desmedida

Ao passo que de perto
parece acelerado,
e quando tá longe
é tudo ao contrário

É devagar...
Ô tempo que não passa...
Parece que nunca chega a noite,
nem clareia o dia

As mão fica buliçosa
Vire e mexe,
aqui e acolá
Entre caneta e papel,
entre mão e corpo

O juízo atrapalhado
ri de besteira,
chora por ausência,
passeia calado

Viaja entre o real e o imaginário,
entre o que não existe
e o que pode ser provável

Mente pra si mesmo
acredita na verdade que disse
e segue...

Apostando a vista
que o amor ampare
o ser adoentado

E melhore os sintomas de atordoamento
e que o tempo trate do resto
De deixar menos difícil os dias
e mais alegre os verso

De ver beleza com toda simplicidade
de cada um que oferece
o seu eu sem a propriedade
de ser latifúndio ou coisa parecida

Mas roça sem cerca
que chega
vai, volta
se assim for desejo comum permitido

Arma acampamento
solidifica a base
Se arma de foice, facão, enxada:
ao plantio

Que há de chover
E ainda na fé
há de colher as frutas mais doces
E as flores mais cheirosas entre os cactos e espinhos
nesse ser (tão) catingueiro.

quarta-feira, 25 de abril de 2018

Assunto

Acredite, a medida
que tenho dezenas
centenas, milhares
de poesias contidas
prontas pra despontar

Que tenho canções em mim,
são versos e melodia
querendo cantar

São artes das mais diversas
que versam sobre o amor
e o paradeiro das coisas da vida

Mas, assunte
chegue mais perto pra ouvir, ver, sentir
Tire os sapatos, de preferência

As horas são todas
e o tempo é vasto

Ao passo do que importa
que você encoste a porta,
se deite ao meu lado,
se dispa dos males que te aflija

E fale...
Que sou todo ouvidos,
boca, língua, dente
e o que mais quiser

segunda-feira, 2 de abril de 2018

Tesão


Entre o teto e o tato: o método
Entre ato e o relato: o texto
Entre o tempo e o que tento: a sorte
tênue, sem veste nem norte

Era noite, e tu chegastes.

Entre tantas , entretanto
Teu atinar tão tonto
Entreteu-se em mim a tal ponto
Que teceu-se em texturas destituídas de temerosidade

No intuito de ser
Antídoto (as pestes)
Antítese (aos testes)
E ímpeto a arte

Sorte
é
ter-te
tão tua

quarta-feira, 28 de março de 2018

Da circularidade do Tempo


Tenho ela em pura alegria
Tenho ela em purpurina colorida
Das águas da mãe salgada
Do tão doce dos ibejis

Minha mana consagrada
Já nasceu luz em ambiente
De brilho dourado da Chapada
Se fez encanto em vida

De uma beleza que desarma
De uma intuitividade e leveza
Que o vento apaga

Das tuas gírias tão revoltadas
Da sensibilidade ariana
E um amor tão denso, tão fino
Que não cabia nesse mundo

Teus saltos tão quânticos
Tua liberdade tão avançada
És luz em mim irmã
És força pra minha caminhada

Tua existência pode parecer curta
Mais foi intensa e verdadeira
E tudo tende ser como é
Era...

Guardo há dias essas palavras
Cheias de amor e lagrimas
Mas que acredita no continuar das existências

Que tu se materializa em luz amorosa,
Arte, poesia
Porque tu foste tudo em vida,
Obra mais harmoniosa

Volta à terra aos braços do caçador
Alimentar uma floresta
Volta aos braços da mãe d’água
Alimentar um mar de possibilidades.